Plataformas devem promover envolvente seguro para jovens, diz instituto
Escrito por Agência DM3 em 16/04/2025
Diante de câmeras que transmitem seus movimentos ao vivo para 141 pessoas na internet, um juvenil de 17 anos atira coquetéis molotov em um varão que dormia em situação de rua no Rio de Janeiro. A vítima sobrevive, mas fica em estado grave e sofre queimaduras em 70% do corpo.
Segundo a Polícia Social do Rio de Janeiro, o violação bárbaro foi incentivado e contratado no Discord, uma plataforma do dedo frequentemente usada por crianças e jovens para bate-papo. Em um duelo promovido por usuários da plataforma, um prêmio de R$ 2 milénio foi oferecido ao juvenil.
As investigações constataram que o ataque não foi um ato solitário e demonstram o risco à espreita de crianças e adolescentes na internet ─ sejam eles alvos da violência ou aliciados para cometê-la.
Os administradores do servidor que veiculou o vídeo do ataque compunham uma organização criminosa especializada em crimes cibernéticos. São investigados nesse contexto crimes de ódio, de tentativa de homicídio, de instigação ao suicídio, de maus tratos a animais, de apologia ao nazismo e de armazenamento e divulgação de pornografia infantil.
“A atuação do grupo é tão significativa no cenário virtual que mereceu a atenção de duas agências independentes dos Estados Unidos, que emitiram relatórios sobre os fatos, contribuindo com o trabalho dos policiais civis envolvidos no caso”, disse a corporação.
Responsabilidade compartilhada
A responsabilidade por ambientes digitais seguros para crianças e adolescentes é compartilhada entre as famílias e as escolas e não deve estar dissociada da regulação das grandes empresas de tecnologias pelo Poder Público, defende o coordenador de do dedo do Instituto Alana, Rodrigo Nejm.
O profissional em ensino do dedo é em prol da responsabilização das plataformas virtuais que não protegem os adolescentes dentro de seus espaços.
Nejm considera que é obrigação das chamadas big techs a adoção de procedimentos de segurança. “[São necessários] mecanismos de proteção que envolvam mais responsabilização das empresas que não protegerem os adolescentes que estão lá dentro; mecanismos de recomendação de teor mais cuidadosos para não recomendar teor violento, teor não saudável; e regulação também para responsabilizar as empresas que usam funções de design aditivas, ou seja, funções chamadas de design manipulativo, que comprovadamente causam prejuízos à saúde dos usuários.”
Verificação etária
Outro procedimento recomendado é a verificação etária, com métodos que vão além da autodeclaração, facilmente burlada quando o usuário somente informa sua data de promanação. Em dezembro de 2024, foi validado no Senado Federalista, e está em discussão na Câmara dos Deputados, o projeto de lei (PL n° 2628/2022), que prevê a verificação etária em serviços de redes sociais e em sites pornográficos.
De combinação com Rodrigo Nejm, a conferência da idade do internauta é uma importante barreira da ingresso de crianças e adolescentes nas redes sociais, para não permitir que indivíduos muito jovens acessem serviços e conteúdos a públicos mais velhos. No entanto, é preciso cuidar de quem já navega nesses ambientes.
“Vários métodos são possíveis, que podem ser mais rigorosos para plataformas mais perigosas, e métodos mais básicos, para plataformas de menor risco. Logo, o que a gente precisa agora, definitivamente, no Brasil é de uma regulação que exija a existência desses métodos”.
Cyberbullying
O debate sobre o incitamento à violência em ambientes digitais, sobretudo com o aliciamento de crianças e adolescentes para a prática de crimes, ganhou ainda mais impulso com o sucesso internacional de Puberdade, no streaming Netflix. Em quatro episódios, a série trata do homicídio de uma moçoila, do qual principal suspeito é um colega de escola. Com adolescentes imersos em linguagens próprias e em plataformas digitais que seus pais e as autoridades desconhecem, o seriado mostra o desamparo dos menores de idade e o despreparo dos adultos diante das múltiplas ameaças do envolvente do dedo.
Entre essas violências a que crianças e adolescentes estão sujeitos está o cyberbullying, também presente na narrativa da série britânica. A psicóloga e neuropsicóloga pelo Instituto de Psicologia Aplicada e Formação de Portugal (IPAF), Juliana Gebrin, entende que a série é importante para o processo de conscientização sobre a situação da ocorrência do bullying em escolas e em outros espaços de convívio física e virtual.
À Escritório Brasil, a profissional defendeu que a melhor forma de tratar a questão é a prevenção, e que é preciso que os responsáveis e as escolas identifiquem sinais de que o bullying está ocorrendo. Os sintomas podem ser percebidos tanto em agressores uma vez que nas vítimas. Ela percebe que, em várias situações, o atacante pode ter sido vítima de outras perseguições.
“Eu vejo muitas pessoas feridas ferindo outras pessoas. Não justificando a conduta maldosa de uma pessoa que faz bullying, mas explicando. Eu vejo essa situação se perpetuando: de pessoas que já sofreram qualquer tipo de situação uma vez que essa.”
A profissional traça um perfil do atacante e indica tratamento psicológico. “São pessoas que têm prazer pelo poder. Para subir um pouco a autoestima, elas precisam ‘pisar no pescoço’ de outras pessoas pela autoafirmação. Alguns podem ter alguns traços de psicopatologia, sim, tendo prazer em ver o sofrimento alheio, sob alegado tom de gracejo. Mas, isso não é gracejo que se faça com alguém”, taxou.
Traumas
Pela experiência clínica em consultórios, a neuropsicóloga Juliana Gebrin aponta que as principais vítimas do bullying são indivíduos que fogem dos padrões de venustidade, de comportamento ou pensamento socialmente aceitos; pessoas com deficiência, LGBTQIA+, crianças e adolescentes tímidos.
As vítimas costumam mudar o próprio comportamento de uma forma drástica, ficam mais agressivas, ansiosas ou deprimidas, com baixa autoestima, tendem ao isolamento social e, em casos mais graves, têm planos e até tentativas concretas de suicídio. A profissional cita outros indícios de sofrimentos emocionais, lista a profissional.
“O bullying atrapalha tudo. O desempenho escolar começa a decair de uma forma abrupta; as relações sociais também, porque a pessoa não vai querer mais se relacionar por encontrar que os outros possuem aquela malvadeza, do bullying; a tendência ao isolamento é a tentativa de se proteger do mundo em que ela vive. Há a tendência a ter impaciência, depressão, quadros de TEPT, que é o transtorno de estresse pós-traumático”, explica a neuropsicóloga Juliana Gebrin.